Virei Influencer. E Agora?
- Luiz Carlos Famadas Jr
- 20 de jun. de 2017
- 3 min de leitura

Era um dia como qualquer outro.
Acordei, tomei café e fui para o celular inteirar-me das novidades. Ao acessar o LinkedIn notei que havia algo diferente no design da página de perfil. Não identifiquei de imediato. Olhando atentamente, quase caí para trás: Ao lado de minha foto de perfil havia o selo de “Influencer”.
Como assim? O que fiz para merecer isso? Será um engano do LinkedIn? Um bug? Será que existe algum homônimo meu?
Após o susto inicial, resolvi olhar os perfis dos demais usuários. Afinal, se foi falha do sistema, todos deveriam ter o mesmo selo. Mas não. Não encontrei outros Influencers acidentais. A coisa era comigo mesmo.
Surge em minha mente um misto de euforia e indignação. Sim, afinal é uma grande irresponsabilidade me darem esse título. Nem me pediram autorização. Agora meus seguidores criarão expectativa em tudo que digo e faço. Mesmo somadas todas as funções que me foram designadas em toda minha vida profissional, elas nem chegam aos pés da responsabilidade que jogaram nesse momento em minhas costas.
E agora? Qual será minha primeira postagem sob tal manto sagrado? Um discurso de agradecimento digno de Oscar? Ou uma postagem comum; como se receber o título de Influencer fosse a coisa mais natural de minha vida?
Pensei em postar um simples “oi... alguém?”, como diria uma pessoa que acaba de desembarcar num planeta desconhecido.
Mas, peraí!
Não botemos a carroça na frente do burro. Antes de qualquer postagem inicial, é preciso dar uma recauchutada em meu perfil. Essa foto de boné na praia não combina com um Influencer. Uma imagem de paletó tem muito mais a ver. Ok... E a foto de capa? Não tenho nenhuma imagem discursando para uma plateia empolgada. Falei no máximo para 5 pessoas numa mesa de restaurante. Talvez uma foto de nuvens... não! Nuvens passam a sensação de dispersão. Uma imagem neutra ficaria bem melhor. Uma tela azul. Pronto! Feito!
Agora voltemos à postagem. Não. Melhor um artigo! Sim.
Um artigo digno de um neo-guru.
O que diria um Influencer que não influencia nem a si mesmo? Seria muita pretensão querer ensinar algo a alguém. Ou não. Afinal, se o LinkedIn diz que posso, seria muita audácia negar. Redigirei um artigo com dicas para a elaboração daquele currículo que faria multinacionais se esbofetearem pelo passe de alguém. Mas, peraí... meu currículo não tem mais que 10 linhas. Como querer ensinar algo que eu mesmo negligenciei em toda minha vida?
Começo a entrar em parafuso. Suo frio. Meus dedos não conseguem passar para o teclado qualquer informação útil. Tenho a sensação de que os milhares de perfis que passaram a me seguir - atraídos como ímãs pelo selo de Influencer - estão todos online nesse momento. Só aguardando meu primeiro passo. Torcendo por qualquer vacilo que crie um motivo para me massacrarem.
O LinkedIn acaba de me tirar de minha zona de conforto. Me desespero.
Já sei!
Vou deletar minha conta. Isso!
Será uma saída honrosa. Ninguém ficará sabendo de nada.
Dirijo-me às configurações, e sem pensar muito, clico na opção de encerrar a conta. O LinkedIn ainda pergunta se tenho certeza disso. Como assim? Nunca tive tanta certeza em minha vida!
Pronto.
Está encerrada a conta. Está encerrada a responsabilidade indigna de minha pessoa.
Aí acordo.
Exatamente. Tudo não passou de um sonho.
* * *
Corro para o laptop. Ainda há uma esperança de aquilo ser verdade. Pois é. Acho que fiquei arrependido de recusar o título, ainda que em sonho.
Mas nada... Nada de selo. Bem vindo de volta à realidade. Talvez o excesso de responsabilidade fosse tudo o que eu mais precisava ter naquele momento. Mas o selo não passou de um belo sonho.
Mas então tenho um insight. Não posso trazer “de volta” o selo de Influencer, mas e o resto do sonho? E todas as ideias de turbinar meu perfil? E os artigos motivacionais? Quem tem o direito de dizer que não consigo fazer isso?
Descubro agora que atualizar meus dados e a aparência de meu perfil, além de escrever artigos, deixam de ser um fardo se não carrego o título de Influencer. Percebo como fica mais fácil transmitir minhas ideias e profissionalizar meu perfil sem a obrigação de mostrar resultados. Se um dia, minhas ações do momento presente me proporcionarem a honra de tal título, terei bagagem para encarar o desafio sem maiores dificuldades. Mas nesse instante, não existem mais as expectativas dos outros. Apenas as minhas. Arregaço as mangas e ponho mãos à obra.
Agora sim. Nunca foi tão prazeroso transmitir minhas ideias. Tentar me destacar no meio de tantos, mas sem a obrigação de ser o melhor.
Apenas ser bom no que faço.
Ser eu mesmo.
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